"Posso não concordar com uma só palavra do que dizeis, mas defenderei até a morte vosso direito de dizê-lo."
Lembro do quão chocante foi ouvir pela primeira vez esta frase com que inicio o texto, quando estudando história e os grandes pensadores do passado. Parece que ainda posso ouvir e ver o grande professor Nivaldo, avaiano fanático, inclinando-se, modificando o tom de voz e utilizando de todas as artimanhas da didática e do bom humor para ensinar um dos grandes alicerces da liberdade de expressão. É verdade, no entanto, que não lembro ao certo quem foi Voltaire, o autor da frase. Um homem pode mesmo morrer, lutar, falhar, até mesmo ser esquecido, mas suas ideias podem modificar o mundo mesmo tendo passado 400 anos.
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Uma das charges que renderam ameaças de morte
ao dinamarquês Kurt Westergaard e causaram a maior
crise no país desde a 2a. Guerra Mundial. |
O princípio de tolerância às opiniões divergentes é o que governa grandes países democráticos, como os nórdicos. Ele é levado tão à sério que mesmo ameaças e bombas não fazem seus jornais e jornalistas recuarem de suas opiniões e atitudes.
Liberdade de expressão no mundo
Discordar, infelizmente, fica numa linha tênue entre a ofensa e a crítica construtiva, dependendo do crítico e do criticado. O caso mais marcante e recente é do dinarmaquês Kurt Westergaard, que ousou numa charge personificar Maomé (um pecado pelas leis islâmicas) com um turbante de bomba. Não fosse o suficiente, mais 11 charges sobre o Islã. Entendidas como desrespeito com a fé islâmica, as charges foram motivos para ataques a embaixadas dinamarquesas e passeatas de milhões de muçulmanos. A reação do governo e do jornal entraram para um dos capítulos mais importantes da história da liberdade de expressão:
- "O governo não pode de maneira alguma influir sobre a mídia. E o governo dinamarquês e a nação dinamarquesa não podem ser responsabilizadas pelo que é publicado na imprensa independente" - Anders Fogh Rasmussen, primeiro-ministro da Dinamarca em 2006.
- "O terror, as ameaças e a intimidação são as armas que os terroristas utilizam para, assim, tentar mudar o comportamento das pessoas e levá-las a agir de acordo com a sua vontade." - Editorial do jornal Jyllands-Posten após a reação do mundo muçulmano às charges.
Liberdade de expressão no mundo avaiano
Seria inútil falar tanto sobre esse princípio democrático escrito em nossa Constituição Federal sem contextualizar ao momento em que vivemos no Avaí. O alvo de tantos de repente tornou-se um torcedor que esbraveja nos microfones o que todos esbravejamos nas arquibancadas. Miguelito, que também não é um coitado, passou do ponto e ofendeu os atletas avaianos da mesma maneira com que os ofendemos em nossas cadeiras ou sofás. Mas na rádio mais ouvida da Grande Florianópolis.
Há quem defenda que seja retirado o direito do mais popular e avaiano comentarista esportivo da Ilha de exercer o seu trabalho. Eu digo: mantenha-se o Miguel com seus xingamentos e indignação. Ele tem este direito. Tem também o direito de responder legalmente por suas ações, como atacar a honra de pais de família.*
Não se queira, no entanto, que se exija que a CBN Diário retire o Miguelito da Ressacada. Ele é simplesmente o mais ouvido por ser aquele com que a maior parte concorda. Que seja o afastamento dele uma política da empresa CBN, para evitar problemas maiores, mas nunca uma exigência do Avaí Futebol Clube.
Eu sentiria-me realmente envergonhado e ainda mais decepcionado, mais do que por estar todas as rodadas na zona do rebaixamento, mais do que por cair para a Série B, mais do que por voltar para a Série C, sabendo que o meu Avaí chegou a tal ponto em algum momento da sua gloriosa história.
*Peço aos amigos juristas para comentarem qualquer erro em relação à interpretação das leis.